O Papa a procura de Deus…

O Papa Bento XVI, em visita ao antigo campo de concentração de Auschwitz, na Polônia, chocado com o que viu rememorando as atrocidades praticadas pelo Nazismo, saiu com essa: “…Onde estava Deus naqueles dias…”. A matéria foi publicada na mídia brasileira e mundial, por exemplo na revista Veja ( edição de 7 de junho último ).

A pergunta de Bento XVI causou espanto precisamente por ser ele o maior líder da igreja católica no mundo. Como entender uma pessoa considerada em seu segmento religioso como “representante de Deus” fazer uma indagação de natureza teológica que revela tanta perplexidade?
Na verdade, o pano de fundo da pergunta papal não é apenas de natureza teológica, mas também de matriz emocional. O Papa, sendo um homem como qualquer de nós, lida com os mesmos dilemas existenciais que rondam a alma de todos os mortais. Se Deus existe e é o soberano do universo, porque não intervém diante de monstruosidades como a que levou à morte 1,5 milhão de pessoas no inferno nazista de Auschwitz? Porquê tanta coisa ruim acontece a pessoas que parecem ser tão boas?
A primeira lição dessa visita papal é exatamente a sua humanidade transparecendo numa pessoa como Elias, que “…era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos…” ( Tiago 5;17 ). O Papa é um grande líder, é o chefe do Estado do Vaticano e o grande dirigente da Igreja Católica. Muitos Papas anteriores foram pessoas notáveis, religiosos de extrema visão humanitária. Mas sempre homens, pessoas como todos nós, cheias de indagações e de perplexidades residindo na alma. Ou mesmo como Elias, deprimidos e cheios de dúvidas e de medos habitando no coração.
A outra lição tem a ver com a nossa convicção teológica. Como Deus age e como intervém na história dos homens? Mesmo diante de perguntas aparentemente sem resposta, como essa pronunciada pelo Papa e motivante deste texto, quando analisamos a ação de Deus ao longo da história, o vemos como um Deus que age através de pessoas. Assim olhamos para Auschwitz não como uma abstenção de Deus, mas sim como uma decepção dos homens. Verdade, quem ficou decepcionado foi Deus e não os homens. O Senhor sempre esteve no seu lugar, aguardando a ação dos homens de bem, especialmente dos líderes religiosos que sempre gerenciaram parcela significativa do poder mundial.
Aliás, ao longo da história, Deus tem se decepcionado muito com os homens. Não apenas em situações de catástrofes sociais, políticas e internacionais. Deus tem curtido decepção com a sua “coroa da criação” em dimensões bem menos expostas aos holofotes da história. Nos lares, nos relacionamentos, na vida profissional, nos negócios, no tato com o meio ambiente. Nessas instâncias da nossa vida, muita decepção tem chegado ao coração de Deus.
Nesse sentido, vale muito a pena uma reflexão a partir da seguinte pergunta: Você tem decepcionado Deus? Ou seja, tem se omitido na luta pela justiça, tem abandonado seu posto como soldado do amor e servo da verdade? Como cônjuge, pais, filhos, profissionais e cidadãos, temos correspondido às expectativas de Deus?
É claro que não queremos ver repetido o escândalo de Auschwitz. Mas também devemos ser verdadeiros militantes para que Auschwitz não seja reeditada em micro-universos como os nossos lares, igrejas, repartições e praças públicas.

Deus está sempre lá, no lugar dele, nos olhando com seus olhos de amor, perdão, graça e misericórdia. Aguardando nossa atitude de rejeição a Auschwitz e de preservação do nosso compromisso com os valores do Seu reino. Amém por isso.